Li hoje uma passagem do Raduan Nassar que é perfeita: “Desde minha fuga, era calando minha revolta (tinha contundência o meu silêncio! Tinha textura a minha raiva!) que eu, a cada passo, me distanciava lá da fazenda, e se acaso distraído eu perguntasse ‘para onde estamos indo’? Não importava que eu, erguendo os olhos, alcançasse paisagens muito novas, quem sabe menos ásperas, não importava que eu, caminhando, me conduzisse para regiões cada vez mais afastadas, pois haveria de ouvir claramente de meus anseios um juízo rígido, era um cascalho, um osso rigoroso, desprovido de qualquer dúvida: ‘estamos indo sempre pra casa’.”* Emocionei-me com o texto, com a intensidade que beira a crueldade em Nassar e lembrei-me de José Afonso, pai amoroso de minha amiga Marisa. Agora, já na velhice, o belo negro chora pesarosamente o fato de não enxergar mais, contando à Marisa o quanto isso lhe dói. A vida toda ele foi dado à leitura e hoje está privado desse prazer. Que bom que tenho olhos pra Raduan e pra tantos outros.
*In: Lavoura Arcaica
2 comentários:
você sublinhou uma das passagens que mais admiro no romance, que, na verdade, é todo belo.
um professor da ufpr disse certa vez que o lavoura é o romance mais belo do século XX.
leia a entrevista que ele concedeu pra revista do instituto morera salles.
o cara escreveu apenas três obras, e as três fundamentais.
Realmente, meu caro Quase, ele é de tirar o fôlego, o juizo e a vontade de parar de ler. Lerei a entrevista. Inté!!!
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