28/11/2007

Jangada de Pedra

“Mãe amorosa, a Europa afligiu-se com a sorte das suas terras extremas, a ocidente. Por toda a cordilheira pirenaica estalavam os granitos, multiplicavam-se as fendas, outras estradas apareceram cortadas, outros rios, regatos e torrentes mergulharam a fundo, para o invisível. Sobre os cumes cobertos de neve, vistos do ar, abria-se uma linha negra e rápida, como um rastilho de pólvora, para onde a neve escorregava, e desaparecia, com um rumor branco (...) Não podia força humana nada a favor duma cordilheira que se abria como uma romã, sem dor aparente, e apenas, quem somos nós para saber, porque amadurecera e chegara o seu tempo. (...) não era mais possível, do Atlântico ao Mediterrâneo, atravessar a fronteira a pé ou em veículos terrestres. E nas terras baixas do litoral, os mares, cada um de seu lado, começavam a entrar pelos canais, misteriosas gargantas, ignotas, cada vez mais altas, com aquelas paredes a pique, rigorosamente vertical do pendulo, o corte liso mostrando a disposição dos estratos arcaicos e modernos, as sinclinais, as intercalações argilosas, os conglomerados, as extensas lentilhas de calcários e de arenitos maciços, os leitos xistosos, as rochas silicosas e negras, os granitos e o mais que não seria possível acrescentar, por insuficiência do relator e falta de tempo.”

José Saramago

2 comentários:

Anônimo disse...

Menino!!!!
Que delícia esse blog!
Que ele se frutifique em textos e poemas que cantem o que te encanta a alma! Será que a tal “pura presunção pequeno-poética mal disfarçada” é contagiosa??? Rsrsrsrs
Serei leitora assídua!
Beijos!

Anônimo disse...

Obrigado, moça!!! Não duvide, um só segundo, do contágio imediato!
Bj