31/10/2008

Ascensão

Eu que nem fumo
acendi um cigarro de canela
e me senti melhor.
Será que eu trago?
'
stoN

30/10/2008

Perdas, danos, amor e restos humanos

Quando estiquei a mão pela segunda e derradeira vez ele já não estava ao meu lado. Pensar que deve ter ido acordar em outros braços deu-me uma tristeza que veio acompanhada de um alívio. De alguma forma senti-me livre por não ter o belo corpo ao meu lado. Não saberia mesmo o que dizer quando acordássemos e não sei se teria coragem de sair da cama, sorrateiramente, sem falar algo. Tudo toma contornos tão difíceis e insuspeitados no day after. Felizes os louva-deuses que morrem no coito.
stoN

Maciel Antero da Cruz Neto

XIII

É sexta feira, dia de pagamento e Maciel pensa em se divertir um pouco. Não quer ir ao mexicano. Talvez ele procure algo mais dançante e com gente interessante. A solteirice já o incomoda. Sabe-se namorador, tem que ter alguém pra dividir as coisas, só assim se sente bem, mesmo que seja dividir as toalhas limpas. Pensa que precisa mudar de vida e que tem muita louça suja pra lavar quando voltar pra casa. E se ele não saísse e passasse uma inusitada noite de sexta fazendo uma, mais inusitada ainda, faxina na casa? Deve ser bom ser surpreendente e inusitado. As mulheres devem gostar de caras assim.
No fim de noite, sentado tradicionalmente no cantinho esquerdo do balcão, Maciel se despede de Augusto, o cara que serve bebidas no balcão do mexicano. Nem inusitado, nem inovador. Maciel é tradicional demais pra essas coisas.
stoN

28/10/2008

Faz um calor de matar em BH City. Derreto-me diante do ecran e nem sei se vale à pena escrever qualquer coisa. Estudar inglês: nem pensar, o calor sufoca. Será que na Réplubique Française eles têm esse tipo de problema no verão? “Eu sempre quis viver no Velho Mundo/ na velha forma de viver/ o terceiro sexo, a terceira guerra e o Terceiro Mundo/ são tão difíceis de entender"
stoN

26/10/2008

Para o que nem o amor mais sincero
alcança
E toda confissão se faz ineficiente
Quando nem o desejo mais profundo
é suficiente
Resta a amizade.
stoN

24/10/2008

Maciel Antero da Cruz Neto

XII

Maciel recebe uma carta de Marta dizendo que está morando no interior de São Paulo e Alice é sua vizinha. Ele fica excitado de pensar as coisas que elas devem estar fazendo juntas. Já passaram dois meses que a briga do cachorro culminou no rompimento. Foi tanta discussão que Maciel ponderou que Alice, com o bilhete, foi, na verdade, muito sensata.
O trabalho está razoável acostumou-se com todas as estranhezas. Na realidade Maciel anda tão estranho quanto todos de lá. Estranheza pega. Sobe disso quando se pegou tomando café com a alça da xícara virada para o queixo, da mesma forma que a loira da recepção sempre faz.
Provavelmente por saudosismo, Maciel agora é freguês assíduo do bar mexicano e teme chegar o tempo em que não queira mudar de vida.
stoN

23/10/2008

Estréia

São nascidos Isadora e Gabriel. Os gêmeos irmãos de Matheus, motivo das maiores alegrias de minha vida na última década. Agora tenho três sobrinhos. Estrearam hoje, trazendo mais luz para nossa família. Tio coruja que sou, os saúdo e divido com vocês a incontida alegria que me arrebata. Que se divulgue aos quatro ventos: Isadora e Gabriel estrearam!
stoN

22/10/2008

Maciel Antero da Cruz Neto

XI

Marta entra nervosa no quarto enquanto Maciel, distraidamente, fuma uma cigarrilha indiana, sabor cravo, que sua amiga Luana trouxe de Londres. A aparente calma do moço a deixa mais nervosa ainda.
_ Você deixou Asdrubal fugir de propósito.
_ Claro que não, meu amor!
As palavras de Maciel parecem a fumaça. Na verdade ele demorou alguns segundos para se lembrar que era esse o nome do cachorro. Como ele poderia saber que aquele cachorro besta fugiria?
Marta fala muitas coisas e Maciel não consegue acompanhar metade delas. Ele nunca a vira tão brava e, muito provavelmente por isso, tão linda. Ele, distraidamente segue pensando num monte de coisas sem importância enquanto ela esbraveja e tenta adivinhar que tipo de substância tem no cigarro, pois Maciel está mais lerdo do que de costume. Isso a irrita mais ainda.
_ O dia em que eu te dei eu vi que não tinha gostado do coitadinho...
stoN

21/10/2008

Moço, conta-me algo novo
Diga-me alguma coisa que me inspire
Expire-me
Tira-me dessa letargia estúpida
Salva-me de uma manhã de domingo
Ajuda-me, meu camarada, a não morrer de tédio
E de sufoco
Nesse maldito horário de verão
Mostra-me algo que tenha leveza, charme e graça
Dê-me o beijo no asfalto
O da Mulher Aranha
Porco Aranha.
stoN

The World, Justified


20/10/2008

Maciel Antero da Cruz Neto

X

Quando já pensava em vender a máquina de lavar, Maciel conseguiu emprego como trainee numa grande empresa de engenharia e arquitetura. Tudo é novidade e tudo é um saco. Até o cafezinho parece estranhamente diferente. Independente de qualquer coisa, ele precisa garantir o salário no fim do mês, então melhor não ligar para as estranhezas.
Alice cumpriu o que disse no bilhete: não voltou mais. Nem mesmo pra mais uma trepada a três. Já são três meses de namoro e Marta já fala em casamento. Impressionante como mesmo as mais decididas e bem resolvidas tem esse problema. Maciel achava que isso só acontecia com as frágeis e carentes. Doce ilusão. Maciel precisa mudar de vida.
Ston

19/10/2008

Belos Horizontes

A melhor forma de girar pela cidade é com gente de fora. É bom re-conhecer o espaço urbano acompanhado do olhar estrangeiro. É um constante descobrir coisas que já sabia a respeito de ruas, bares e esquinas. A cidade me arrebata. Aceito-me urbano e tento ser urbanista (termo presunçoso que me encanta, me estimula e me assusta). Quero a urbe, preciso entendê-la e me apoderar de seus processos e encantamentos. Preciso destrinchar a textura urbana. Contento-me, quase sempre, em sentir seu cheiro, ouvir seus berros e contar seus pobres que perambulam. Na verdade, a cidade do baixo meretrício me basta.
Ston

18/10/2008

Medo de não mais tê-los


Antes de dormir
tenho pequenos medos.
Quando acordo
eles já cresceram e saíram de casa.
Ston

16/10/2008

Ao mestre


Em 16 de outubro de 1854, em Dublin, nasceu Oscar Wilde

Maciel Antero da Cruz Neto

IX


Marta e Alice são amigas de infância foi a descoberta triunfal ocorrida num copo sujo num fim de noite. Maciel e Marta, após passarem o dia inteiro procurando infrutiferamente o cachorro que fugira, foram pro bar e lá deram de cara com Alice. Esticaram a noite. Maciel gostou de fazer sexo com as duas ao mesmo tempo. Sentiu-se grato às duas. Alice, com ressaca física e moral, foge de manhã antes dos dois acordarem.
Maciel acorda e sabe que tudo vai acabar: agora nem Alice nem Marta. Pensa na solidão, na falta de emprego e nas coisas chatas da vida. Deveria ter economizado o dinheiro da máquina de lavar pra não se preocupar tanto com grana enquanto não consegue trabalho.
Pensa que assim que Marta sumir, o que deve acontecer tão logo ela acorde, ele vai alugar um lugar mais barato, talvez uma quitinete. Marta acorda e eles fazem um sexo violento. Pela primeira vez ela o concede o controle da coisa toda. Foi a melhor trepada que tiveram. Alice poderia ter pelo menos assistido, pensa Maciel.
STon

15/10/2008

Mais do mesmo

É tanta grosseria no mundo. Tanta coisa estranha, cansativa e estúpida que me dá preguiça de tudo, até de sair da cama. Tô muito cansado de arrogância, de prepotência, de egoísmo e, sobretudo, de ingratidão. Juro que tento me esforçar e nem ligar pra essas coisas. Tento mesmo construir relações diferentes ao meu redor, mas as porradas não param: chegam-me de todos os lados, sobretudo de onde menos espero e atingem onde mais machuca. E sobrevém o cansaço e a preguiça. No fim das contas não sobra muita coisa mesmo, só “eu, a viola e deus”. Ou será que foi só mais um dia ruim demais para um cara sensível demais?
stoN

MSN

Está on line
Nem um oi
Oi line
Ô
'
Ston

14/10/2008

Maciel Antero da Cruz Neto

VIII

É aniversário de Maciel e ele resolveu comemorar com estilo. Tem um mês que está saindo com Marta e ela o presenteia com um filhote vira latas. O moço não conseguiu disfarçar o descontentamento com o presente. Trepa com Marta e sente saudade do jeito como Alice conduzia a transa. Está na hora de mudar de vida. Não sabe se é pela trepada ou pelo cachorro. Ainda não tem emprego. Cansou de buscar em escritórios de arquitetura e urbanismo. Talvez Suzane a as outras víboras tivessem razão: a única coisa com a qual saiba lidar seja realmente uma garrafa de vódica. Vai procurar um escritório só de arquitetura.
_ Onde tem uma toalha?
Pelo menos dessa vez ele tem toalhas limpas e secas além de uma máquina de lavar tinindo e um cachorro besta!
Ston

13/10/2008

de chofre

_ Venha logo, Maristela! Ande menina!
Era possível se ouvir a voz adocicada de Marisa ao longe. Era uma negra muito gorda e os filhos sempre foram a sua vida. Desde que Agenor deixou a casa, ela tem se dedicado exclusivamente a Pedro, Maristela e Yago. É por eles que ela passa o dia todo faxinando casas de madame e engolindo sapos dos mais variados tamanhos. Anda cansada demais. Até pra cuidar dos meninos, que é o que ela mais gosta e se orgulha nessa vida.
_ Não espere que eu vá lhe buscar, Maristela!
_ Tô indo, manhinha!
Quando é que essa menina vai tomar juízo, meu Deus. Se não abrir os olhos, ela num vai dar em coisa que preste. As coisas andam tão atravessadas nesse mundo. A menina só quer ficar vadiando na beira da praia o dia todo.
Ofegante, Marisa vai pro quarto. No caminho ela confere o banho de Pedro e Yago. É preciso cuidar para que a conta de luz não suba feito rojão em festa de Nossa Senhora dos Navegantes.
Deitou-se um pouco. As pernas andam inchando demais. Marisa tem medo de trombose, embora o médico tenha afastado essa hipótese. Ela repara que há muito pó sobre a mesinha no canto do quarto, onde guarda os livros e cadernos das crianças. Deve ter semanas que não se passa um pano ali. Ela pensou em se levantar e limpar a poeira, mas antes de fazer um movimento sequer, uma dor dilacerante lhe atingiu o peito. Um infarto a pegou de cheio.
Maristela foi quem mais chorou no enterro, ela sabia que a vida seria bem mais difícil de agora pra frente. E foi.

Ston

12/10/2008

Ando perdido em resquícios de desejos antigos salpicados de nuances diáfanas de novidade. Nada que se sustente no peito pelo tempo suficiente de uma paixão ou de duas doses de run num copo sujo. “Que Deus te guie porque eu não posso guiar.” E que não me venham dizer que a falta de rumo é mero pretexto disso ou daquilo, bem sei que de despretensioso que sou, deixo ao largo tudo que é baliza ou justificativa para todo e qualquer sentimento meu. Espero apenas que tudo não resulte em mais uma noite, em vão, na companhia da amargura e de um bom amigo ouvinte. É nessa hora que algo em mim esbraveja: “Larga a mão disso, moço! Vale à pena perder tempo com essas idiotices não!”. Sou um cretino pretensioso, penso a dor.
Ston

Noites imperfeitas frases feitas

Uma noite insone com algo/alguém que valha a pena é melhor do que qualquer sonho

10/10/2008


09/10/2008

Este poema do Arnaldo já figurou aqui em dezembro último. Todavia, devido a impublicáveis questões de ordem pessoal, ele precisa dar as caras aqui de novo.
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O amor, sem palavras. Ou. A palavra amor, sem amor. Sendo amor, ou. A palavra ou. Sem substituir nem ser substituída por. Si, a palavra si, sem ser de si gnada ou gnificada por. O amor. Entre si e o que se. Chama amor, como se. Amasse (esse pedaço de papel escrito amor). Somasse o amor ao nome amor, onde ecoa. O mar, onde some o mar onde soa. A palavra amor, sem palavras.

Arnaldo Antunes

08/10/2008

Maciel Antero da Cruz Neto

VII

Era uma estranha manhã de chuva fina. Tão desconcertante quanto uma manhã chuvosa pode ser. Na fila do Seguro Desemprego, atrás de uma senhora prodigiosamente gorda e com uma blusa roxa, estava Marta. Morena linda, voluptuosa, farta, repleta de salutares curvas.
Ela oferece a Maciel um pedaço de chocolate, talvez por ter percebido no olhar dele mais fome do que desejo. Ele, mais desconcertado do que de costume, sentia vergonha da camiseta surrada que usava. Combinam de sair pra um mojito num bar mexicano. Ele sabia que isso não daria em nada. Como algo realmente consistente pode começar na fila com chocolate, fila de Seguro Desemprego e mojito num barulhento bar que obriga os garçons a usarem sombreiros? Seriam apenas dois desempregados numa noite suja.
Marta é decidida e possui o discreto charme da burguesia, consegue controlar tudo e todos sem parecer arrogante ou antipática. Maciel gosta disso, ele nasceu pra obedecer.
Ston

Não Identificado

Eu vou fazer uma canção pra ela
Uma canção singela, brasileira
Para lançar depois do carnaval
Eu vou fazer um iê-iê-iê romântico
Um anticomputador sentimental
Eu vou fazer uma canção de amor
Para gravar um disco voador
Uma canção dizendo tudo a ela
Que ainda estou sozinho, apaixonado
Para lançar no espaço sideral
Minha paixão há de brilhar na noite
No céu de uma cidade do interior
Como um objeto não identificado

Caetano Veloso

07/10/2008

No meio do dia

reunião tão chata
quanto uma reunião pode ser
quero tomar um bom café
tão bom quanto um café pode ser
Ston

06/10/2008

Montes Claros



Minhas putas tristes são alegres e dançam com os garçons.



Ston

Maciel Antero da Cruz Neto

VII

Feliz com seu MP3 o moço se dá um tempo de férias. Tempo suficiente para ajeitar algumas coisas em sua casa. Comprou finalmente uma máquina de lavar nova, o que facilitou um pouco as coisas. Pena que Alice não pode sentir a maciez das toalhas agora.
Maciel está contente por poder ir ao cinema no meio da tarde num dia de semana. É coisa muito boa. Ir ao cinema e estar feliz são coisas muito boas. E ainda tem o bar do Euclides que o traz uma paz nunca antes experimentada.
Depois de duas semanas bate uma saudade assustadora de Alice. Maciel precisa mudar de vida.
Ston

04/10/2008


"Foi tanta força que eu fiz por nada
Pra tanta gente eu me dei de graça
Só pra você eu me poupei"
Leoni

Maciel Antero da Cruz Neto

VI

Passadas duas semanas do baile de formatura e Maciel ainda não se lembrava de muita coisa que havia acontecido. Era frustrante demais perceber que além de não ter que ir à aula todos os dias, nada havia mudado consideravelmente em sua vida como ele esperava.
Pensava isso até encontrar um bilhete que Alice havia deixado em baixo da porta:
“Nunca mais volto”.
Era isso? É assim que se terminam os relacionamentos? Vai saber.
No dia seguinte Maciel criou coragem e pediu demissão do Escritório de Arquitetura e Urbanismo. Suzane, por pura compaixão, o demite.
Ston

02/10/2008

Desejo sede

Seco que estou
clamo por sede
tudo que era perene
em mim
minguou
até a sede.
`
Ston

01/10/2008

Maciel Antero da Cruz Neto

V

No dia seguinte ao baile de formatura Maciel está igual a um pinto na merda. A festa foi boa demais, há felicidade demais, foi bebedeira demais. Ele está livre demais da faculdade de merda, da rotina de merda, do macarrão de merda do Sr. Edson... Mesmo acordando no banco traseiro do carro de um amigo, é felicidade demais. Não sabe do amigo. Pra dizer a verdade, Maciel se esforça para se lembrar de quem é esse carro, quem é esse amigo. Confusão demais. A ressaca monumental é da ordem do insuportável.
Chega em casa passando por uma verdeira maratona no transporte público. Depois de um sono revigorante, ou perto disso, ele passa o dia todo em casa ouvindo Bach e tomando suco de abacaxi. Às vezes parece que tudo na vida de Maciel é demais. Totalmente demais...
Ston
Acordei pensando em mudanças e nas várias coisas que aguardam conserto e reforma em minha casa. Deparei-me com a seguinte frase no livro que estou a ler: “O lance é colocar freio no logro humano de si mesmo, a começar com o meu.*” Vou mudar é nada e as tranqueiras continuarão quebradas. Vou ler Leminski.
Ston
*John le Carré in: Amigos absolutos