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01/05/2009

MARÉ BAIXA 09

Depois de alguns meses e vários programas, os dois já possuem o que pode se chamar de amizade. No último sábado, um dia morno e um tanto triste, Miguel e Arlete foram levar João Victor ao parque. Havia muito tempo que Miguel não sentia tão feliz. Era a tarde perfeita de uma família feliz a passear na melhor cidade do mundo. Nada poderia afetar sua poliânica felicidade. Na volta para casa passou por um bar e se encontrou com uns amigos. Não teve coragem de comentar sobre o seu novo relacionamento, pois, por certo, havia algo diferente entre ele e Arlete, uma coisa além da trivial relação com uma prostituta. Isso era claro para ele: eles tinham algo. Foi pra casa feliz, cansado e bêbado. Dormiu pensando em sair da livraria e que ele gostaria de ser o pai daquele menino.
stoN

26/04/2009

MARÉ BAIXA 08

Miguel anda encafifado: Como pode uma lésbica ser prostituta? Ele duvida da orientação sexual de Arlete e considera que ela gostou foi muito das três vezes que eles treparam. Chegaram a conversar algumas amenidades, mas não teve coragem de perguntá-la sobre o tema. Pensa nela o dia todo e já comprou um presente. Não sabe se terá coragem de entregá-lo à moça. Pensou em também comprar um livro para João Victor. Será que esse moleque gosta de livros? O universo de Miguel está circunscrito entre a livraria, sua casa e a esquina de Arlete. Difícil pensar em outro presente que não fosse do seu trabalho. Da última vez que transaram, Arlete lhe pareceu distante e triste. Miguel tem pena e vontade de lhe oferecer o mundo, mas ele não o tem. Só se oferece o que se tem, pondera o rapaz e tenta se consolar pensando que um dia ele o tenha. Enquanto isso ela terá que se contentar com um livro, mas um dia...
stoN

22/04/2009

MARÉ BAIXA 07

Pela primeira vez nosso herói conseguiu abordar Arlete e, ousado como nunca, combinou o programa. Ela estava receosa, já tinha botado reparo no rapaz e tava cismada com aquela postura. De início achou que fosse traficante novato, mas depois viu que ele só ficava observando. Pensou: É um pervertido novato, então. Miguel achou a trepada maravilhosa. Ela era melhor do que ele esperava. Era perfeita, carinhosa, bonita demais, e tinha aquele jeito de olhar pro lado que o deixou louco. Ele foi muito intenso o que reforçou a idéia de que ele era meio psicopata na cabeça dela. Teve vontade de pedi-la em casamento naquela mesma noite, ou pelo menos para dormir na cama dela até o dia clarear. Não teve coragem.
stoN

09/04/2009

MARÉ BAIXA 06

Arlete acordou cedo, numa ressaca incomensurável e foi levar João Victor à escola. Na volta o mesmo ritual: padaria, sacolão e uma passadinha e banca de revista para comprar cigarros. É uma mulher forte, desencanada e safo. A vida na rua ajuda a deixar as pessoas espertas. Depois do cigarro e do café com pão, voltou pra cama para dormir até a hora de buscar o moleque na escola e ajeitar um pouco a casa. Pensou em como seria bom ter uma companheira com quem pudesse dividir as coisas. Às vezes criar João Victor sozinho lhe era pesado demais. Sentiu-se só e adormeceu mesmo com o barulho da rua.
stoN

04/04/2009

MARÉ BAIXA 05

A infância de Miguel foi o que se pode chamar de uma meninice normal. Fazia tudo que os outros moleques faziam. Lembrou-se de Ana, sua primeira paixão, menina linda da sexta série que tinha perfume muito bom. Vai ver era do xampu que ela usava. O primeiro carrinho de controle remoto dado pelo tio. Lembranças faziam a tarde parecer mais leve. Sempre que não tinha nada pra fazer, Miguel gastava horas recordando essas coisas, buscando detalhes, chafurdando a memória o máximo possível. Atualmente ele não tem tido tempo para isso. A lembrança do sorriso de Arlete consome todo o tempo livre. E o que não é livre também. Às vezes ele teme estar obcecado.
stoN

02/04/2009

MARÉ BAIXA 04

Acordou sentindo-se como se não tivesse dormido nem cinco minutos. No banho, Miguel tenta recapitular a noite: horas e mais horas no bar, observando Arlete de longe, cinco doses de rum, duas cervejas, três cachaças e uma dose de vodca da pior espécie. A cabeça parecia não ser dele, pesava muito sobre o pescoço. Na saída pro trabalho, cerca de quarenta minutos depois, teve um medo grande da morte. Medo de morrer da forma mais besta possível. Engasgado com um osso de galinha, ataque do coração catalisado por um choque elétrico, um descuido e já está o crânio estourado no asfalto. Basta um vacilo.
Já na livraria teve que se fazer de forte, vencer o cansaço e a ressaca para dar conta do trabalho. Todavia não se podia dizer que estava infeliz. Pensou no sorriso de Arlete e teve vontade de viver muito mais ainda. Espantou o medo da morte e já era quase hora de bater o cartão. Perguntou a si mesmo se agüentaria mais uma noite de vigília. Não se respondeu.
stoN

31/03/2009

MARÉ BAIXA 03

Já faz muito tempo que Miguel passa horas a fio, por várias noites, observando Arlete. Já saiu com duas de suas amigas e descobriu bastante coisa a respeito dela. É prostituta há três anos, o mesmo tempo que ele trabalha na livraria, pensou. Descobriu também que ela é lésbica e tem um filho de cinco anos. Miguel tem um interesse enviesado pela prostituta do sorriso bonito. Basta pagá-la, mas isso ele não quer. Ele não quer a prostituta. Quer o sorriso dela. Miguel está se achando um tanto psicopata. As putas também.
stoN

30/03/2009

MARÉ BAIXA 02

Quando viu Arlete pela primeira vez, Miguel logo intuiu qual era a profissão da moça. O visual, o perfume e o local onde estava parada não deixavam margem pra dúvida. Teve vontade de abordá-la, mas não arriscou, nunca foi bom nisso. Nem mesmo a embriaguês dava-lhe a coragem suficiente para tanto. Sentia-se estático, desnorteado e febril, como Raskólhnikov. Nem podia, ou sabia, dizer se era desejo ou não. Só sentia que era inevitável, urgente e emergente estar com ela. Precisava dela, mas não conseguiu chegar até ela. Depois de horas observando Arlete do bar, decidiu voltar no dia seguinte e, aí sim, preparado e com mais segurança, conversar com a moça de sorriso indecentemente lindo. Deve ser por causa desse sorriso que ela conseguiu três clientes naquela noite.
stoN

29/03/2009

MARÉ BAIXA 01

Soraia acabou de comprar um carro e não pretende emprestá-lo para o seu irmão Miguel. O moço está desolado, pois, em pleno sábado, comprou três garrafas de vinho branco, todos os amigos estarão na festa e ele não tem como sair de casa. Com tanta chuva, ir de ônibus seria horrível. Mesmo se ele já tivesse comprado sua moto não teria como sair. A vida nunca é justa para um vendedor de livraria.
Miguel nem se lembra de quando foi que leu um livro. Por certo deve ter sido na quinta série. Mas vê muita importância nos livros e na leitura, pois é através deles que garante o seu mísero salário. De banho tomado, gel no cabelo e bastante perfumado, voltou pro MSN praguejando Soraia que não entende sua necessidade de ser feliz. Aliás, ninguém o faz.
stoN