30/04/2008




Tenho gripe, sede, cansaço e a coleção completa do Milles Davis. Acho que estou bem perto da felicidade, sobretudo se levo em conta que amanhã é feriado. A cidade amanheceu tão nublada quanto um belo horizonte pode ser.

Ontem me encontrei com um amigo que há muito não o via. Foi ótimo perceber que tanta coisa boa permanece, mesmo depois de anos de ausência. Foi estranho levar mais uma porrada do tempo na cara, mostrando o quanto ele é implacável e indelével. No final tudo foi doce, reconfortante e imprescindível.

Que venha logo o dia do trabalhador que eu quero é descansar e torcer para que Cíntia Rosental não esteja lendo isso.

28/04/2008


Tá na cara

O casal à frente me parecia um bom exemplo de relação estável, cordial e madura, até ela começar a espremer cravos no rosto dele. Essas demonstrações de cuidados dermatológicos em público, além de anti-higiênicas e de serem de um mau gosto insuperável, sempre me transmitem a idéia de que o casal não está lá essas coisas. Os cientistas ingleses, que vivem fazendo pesquisas estranhas sobre traição, tempo médio de duração da relação sexual, relação entre acuidade auditiva e orientação sexual e outras querelas, deveriam testar se realmente há algo entre o aumento da atenção à cutis d@ parceir@ e a perda da consistência do relacionamento entre as pessoas.

27/04/2008

Neologismo

Manuel Bandeira

Beijo pouco, falo menos ainda.
Mas invento palavras
que traduzem a ternura mais funda
E mais cotidiana.
inventei, por exemplo, o verbo teadorar.
Intransitivo
Teadoro, Teodora.

25/04/2008

Esfarrapadas Desculpas

Sem computador em casa, com muito trabalho no lombo, não posto tanto, não posso muito, não possuo nada...

23/04/2008


O meu é com batata frita


A semana chegou ao meio bem rápido. Feriado na segunda-feira é, no mínimo, consolador. Sei de mim que estou de saco cheio. Nardonis, Pequim 2008, terremoto no litoral do Brasil, padre muito desocupado voando em balão a gás. Indubitavelmente o mundo está perto do fim.

E como um respiro no meio de tanta balbúrdia, uma matéria de salvação, as coincidências de uma manhã, a caminho do trabalho, reforçam-me o que eu já sabia, desde muito: A amizade é o que me sustenta. Meus amigos me enchem de paixão os dias e enfeitam a cantada de galo no terreiro do vizinho. Já não guardo amores, quero vivê-los todos, todas as noites e terminar, às cinco da madruga, comendo um mexidão no Bolão.

Ao Little Dylan, alegria incontida em 2008 e que tem me feito muito bem.

Balão de gás

Tem-se certeza de uma coisa: pelo menos um padre foi pro céu.

22/04/2008

Nascido em 1932


De passagem pela sala de tv vi meus amigos olhando pra tela sem prestar atenção no que a máquina de fazer doido transmitia. A simplicidade dos móveis do meu quarto trouxeram-me a tranqüilidade de um café da manhã descrito por Saramago. Deu-me vontade de deitar um pouco pra pensar na vida. Madureira disse pra eu me mexer mais e pensar menos. Depois de meio século cuidando do seu corpo, o médico passa a se sentir dono dele. Madureira quer ser dono da decrepitude da minha triste vida

A velhice parece um oceano de lembranças pra gente atravessar. Tem dias que eu só quero boiar. Esperar que venha uma tormenta e sacuda tudo, mas nunca vem. Acho que a única tormenta que me resta é um infarto fulminante...

21/04/2008

Objeto de Amar

Adélia Prado
De tal ordem é e tão precioso
o que devo dizer-lhes
que não posso guardá-lo
sem que me oprima a sensação de um roubo:
cu é lindo!

Fazei o que puderdes com esta dádiva.
Quanto a mim dou graças
pelo que agora sei
e, mais que perdôo, eu amo.

20/04/2008

_____________________Pé de cachimbo


Hoje eu vi um amanhecer muito melhor do que os outros. E não é só por causa do feriado de amanhã. É mais do que a “cabra-cega enxergando na escuridão”. O mundo está mais propício a um fim descente, depois da manhã de hoje. Não me perguntem o motivo. Devo ter acordado um tanto visionário. Um Nostradamus deve ter se apossado de mim, ou pior: a Mãe Diná. Liberta esse corpo que não te pertence!!! Sai de dez em dez pra não dar tumulto... “A gente só morre pra provar que viveu”, sendo assim vamos a esse domingão com tudo, já que as previsões são, no mínimo, arrebatadoras.

Manchete

CHUTES DE POETA NÃO LEVAM PERIGO À META

Paulo Leminski

19/04/2008

sem tido

penso, repenso e dispenso
interpelam-me o mundo, as pessoas, as coisas
sinto-me só, sinto sede de pinga, medo do norte
saudade do amigo e vontade de comer no chinês
sou um ser sentidor
sente dor
fingidor
finge dor

18/04/2008

Parecia que era sábado. O sol era quase do meio do dia e estava muito quente. Arlindo olhou novamente para a estrada e nada via, nada havia. Nem uma viv’alma. Maldita hora em que resolveu ser mochileiro. Cíntya o avisara que já era velho demais para tal, mas não ouvira. Seu primo Gustavo o alertou que as estradas não eram mais tão seguras como na década de setenta, mas ele não ouvira. Agora ele continuava não ouvindo nada. A estrada está deserta, ele tem fome e não há a menor perspectiva de algo mudar essa infame realidade.

Depois de cinco anos de noivado com Cintya, resolvera ter uma aventura inusitada, para espairecer um pouco. Não agüentava mais a vidinha medíocre que levava na empresa. E agora que iria começar num novo emprego, queria dar uma relaxada. Parou de pensar nessas coisas e começou a fazer planos para o casamento. Tudo que ele queria era uma vidinha tranqüila.

Do outro lado do estado, Cintya prepara uma salada para o almoço em família. Pensou em Arlindo por um segundo. Um observador incauto diria que ela rezava por ele, mas no fundo ela pensava se queria realmente continuar com o noivo. Talvez fosse melhor que ele não voltasse. No dia seguinte ela recebeu a notícia de que Arlindo havia telefonado, mas pediu para que não a acordassem. Deixou recado que estava bem e que voltaria em dois dias. Tempo suficiente para ela fazer as malas e não estar em casa quando ele chegasse. Assim ela o fez.

Pudor e lama

PUriTAna
Puta Ana
Putana

a alguém que sabe quem...
stoN

17/04/2008


Quando eu era criança, rezava muito para Deus proteger todo mundo que eu gostava. Depois eu passei a protestar pela preservação de florestas, pelo socialismo, pela participação popular. Em seguida eu me achei nos movimentos sociais. Era um só apelo pela revolução feita sem armas, mas com muita luta cotidiana. Agora eu sou agnóstico, sou descrente e medíocre. Parei de acreditar em um tanto de coisa, mas continuo crente que um dia tudo isso melhora. A gente vai morrer mesmo...

Fragminto

O outro sou eu
O meu mundo é todo espelhos
Sartre é o inferno.
stoN

16/04/2008

A felicidade é um estado de Smirnoff
INDELÉVEIS POSTURAS
Você se pinta e tatus agem

15/04/2008

O MP3 me impede de morrer de tédio no metrô. O computador d’eu sentir solidão no meu quarto. O Bocaiúva garante minha sanidade. Doses de Vale Verde e bolinho de carne, criteriosamente ministradas por Martinha, são a posologia mais eficiente para o meu quadro clínico. Há também a terapia de grupo, o sassarico pseudo-ideológico-informativo com os comparsas, que é o que realmente me move. Levando-se em conta que o amor, comprovadamente, é filme e que Deus é expectador, também considerando que já está mais do que provado que só se pode filosofar em alemão, prefiro continuar com minha receita infalível: Secador, maçã e lente.

13/04/2008


Puta que pariu!!! Preciso tomar um açude!!! Entre rimas de cordel e água gaseificada acordar é um processo lento, doloroso e febril, que chega à beira da insensatez. Perceber que as pessoas vivem, andam pelas ruas na ensolarada manhã de domingo e, pasmem, chegam até a falar, foi terrível. Tive vontade de voltar pra casa (de quem?), pra cama, pra caverna, pro útero. A única certeza que me fica: Se deus realmente existe, ele nasceu de um beijo na boca. "This litlle part of my life is called happiness".

10/04/2008

Circuitos espaciais de produção e círculos de cooperação mostram o uso diferenciado de cada território por parte das empresas, das instituições, dos indivíduos e permitem compreender a hierarquia dos lugares desde a escala regional até a escala mundial.

SANTOS, Milton; SILVEIRA, María Laura. O Brasil: Território e sociedade no início do século XXI. 3. ed. Rio de Janeiro: Record, 2001. 473 p.

Cacofônicas Políticas


Promulgada lei que prolonga pavimentação de logradouro público.
stoN

09/04/2008

Foi de um jeito estranhamente austero que Solange me comunicou que nosso relacionamento estava rompido. Qual relacionamento? Por dois longos minutos me perguntei sobre isso e depois voltei a me dedicar ao trabalho. O telefone toca de novo. Vou mandar Solange à merda, pensei.
_ Arlindo, você pode vir até a minha sala?
Praticamente me teletransportei para a sala de Oscar. O cara era um bom chefe, sempre tinha sido legal comigo.

Duas horas depois estava sentado num banco do parque. Fui demitido. Pretendo nunca mais atender ao telefone e se o fizer, será para xingar o interlocutor.
Comprei um saco de pimentinha e fui pra casa. Com o celular desligado. Se o bicho toca é capaz de começar uma guerra ou pra me avisarem que tenho apenas três meses de vida.

Encontrei Solange me esperando na porta do prédio. Como, diabos, ela sabia que voltaria pra casa mais cedo? Será que ela estava tendo um caso com Oscar? Pouco provável. Ele parece gay demais para ela e Solange é metódica demais pra ele.

Penso em passar direto, fingir que não a vi. Tentativa frustrada, ela corre em minha direção, me enche o peito de murros e, aos berros, anuncia pro quarteirão inteiro que sou um canalha. Como se todos já não soubessem.

Depois de me livrar da descompensada vou comer minha pimentinha com suco de limão e ver tv. Hoje eu poderia ter o meu “dia de fúria”.

06/04/2008

Definição do Amor

Gregório de Matos

Mandai-me Senhores, hoje
que em breves rasgos descreva
do Amor a ilustre prosápia,
e de Cupido as proezas.
Dizem que de clara escuma,
dizem que do mar nascera,
que pegam debaixo d’água
as armas que o amor carrega.
O arco talvez de pipa,
a seta talvez esteira,
despido como um maroto,
cego como uma toupeira
E isto é o Amor? É um corno.
Isto é o Cupido? Má peça.
Aconselho que não comprem
Ainda que lhe achem venda
O amor é finalmente
um embaraço de pernas,
uma união de barrigas,
um breve tremor de artérias
Uma confusão de bocas,
uma batalha de veias,
um reboliço de ancas,
quem diz outra coisa é besta.

05/04/2008

03/04/2008

O pensamento

O cheiro do alho e da cebola fritos no azeite fez doer de fome o estômago de Alfredo. O prazer doce de assistir tv, tomar cerveja e ouvir e sentir o almoço sendo preparado era uma grande satisfação no início de tarde. Na cozinha, Dona Cleuza abaixou-se para pegar o caldo de galinha no armário. As costas doíam. Fazia tempo que ela já não era mais aquela “flor viçosa” que Alfredo descrevia em poemas suburbanos, cheios de suspiros e floreios. Os suspiros agora são apenas de saudade e de cansaço. Não havia mais caldo e a porta do armário despencou. Nem tentou arrumar.

_ Frêdo, olhe esse molho enquanto busco um troço no mercadinho da esquina.

Ele fingiu não ter ouvido. Ela saiu e nem reparou onde caíra o avental.
Dona Cleuza nem pensava mais no mercadinho e andava descompromissada e sem rumo. Quando deu por si, já havia entrado no ônibus. As ruas passavam por ela e as portas das lojas e os portões das casas pareciam acusá-la de velhice, de insanidade, de cheirar a cebola, mas ela não pensava nisso. Não queria pensar em nada.

Desceu no ponto próximo ao baixo meretrício e nunca mais voltou pra casa. Ela não pensou em nada. Seu primeiro cliente ainda pôde sentir o cheirinho de tempero caseiro em suas mãos e em suas roupas. Foi consolador, ele se lembrou do colo da mãe, no interior da Bahia. E ela teve o seu primeiro orgasmo.

Dona Cleuza, mesmo depois de anos, não pensa no que fez ou no que deixou de fazer. Nem mesmo no moço bonito, de olhar penetrante que sempre a observa do ônibus. Ele sabe que ela é puta, mas Dona Cleuza preferiu não pensar nisso.
Catarina Sá

02/04/2008

Palatáveis palavras


prosopopéia
enveredar-se
preâmbulos
promiscuidades
terminologia
petulante
meandros
vagabunda
sapiência
desertificação

01/04/2008

nunca durma pelado/a

¨
Tudo anda tão estranho no mundo. Tem até chiclete dietético sabor melancia. Onde vamos parar com isso? O que mais essa gente vai inventar? Sei que vai dando é desespero diante de tanta inútil novidade, novas inutilidades... E tudo continua tão confuso quanto antes, ou pior. É mesmo o fim de tudo e o começo do nada. Tem sempre consolo: “Largo tudo se você chegar agora/ O amor tá em cima da hora/ O seu amor ou o meu?/ Não dá/ Logo depois de amar/ As lágrimas rolam e ninguém me diz/ Não dá/ Posso te esperar, ou não/ Mas quase não dá para ser feliz”