18/08/2008

Maristela acordou muito cedo e teve preguiça de enfrentar o frio que imperava para além do aconchego das alfaias. Sabia que a neblina circundava a casa toda, que não enxergaria nem a porteira do curral. Ainda tonta de sono começou a pensar na vidinha tacanha que vivia no sítio com Almindo. Ele já deve estar ordenhando. Sempre acordava cedo e, depois de preparar o café forte e doce, ia para o curral cuidar das vacas. Ela já não pensava em melhorar as coisas no sítio para eles terem mais conforto. Cansara-se de tentar convencer ao companheiro de que poderiam viver um pouco melhor sem gastar grande fortuna ou cometer pecado algum. Queria uma vida melhor, mas isso não pressupunha, obrigatoriamente, a companhia de Almindo.
Com certo custo, levantou-se e foi tomar o café doce do marido. O mesmo café doce de todos os dias. Viu seu reflexo no alumínio areado das panelas. Teve saudade do viço da mocidade. Era preciso ter muita coragem para envelhecer com dignidade. Não era o seu caso. Preferiria morrer a ter que continuar vivendo no sítio.
Almindo sabia que perderia a companhia da morena logo. Conhecia as coisas da natureza, e a essência humana não difere das dos bichos. A cabrocha estava triste demais e, como ave canora capturada, fica amuada, sente falta de liberdade e quer céu.
Ston

5 comentários:

Henrique disse...

bonito.

Ston disse...

Obrigado, Gatomário. Gostei da foto. Eu me casaria com alguém com tão portentoso bigode.

Anônimo disse...

Texto bacana, Ston!
E bigodão de respeito de GatoMário: digno de Clark Gable!
Beta

Ston disse...

Beta, obrigado. Eu diria que é um Senhor Bigode!!! Bj

Anônimo disse...

De Nietzsche:

Eis-me suspenso a um galho torto
E balançando aqui meu cansaço.
Sou convidado de um passarinho
E aqui repouso, onde está seu ninho.
Mas onde estou? Ai, longe, no espaço.

No sul - Quatro Poemas